sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O que eu faço agora?

Emprestei meus olhos por um momento.
Nada via,
Tudo sentia.
Ao meu ver, não via nada.
O escuro era branco e meus passos sem
Movimentos.
Emprestei meus braços por um tempo.
Apesar dos braços,
Briguei pelos olhos.
Riram quando não soube
Abraçar, mas sem bra
Ços, o que eu poderia fazer?
Amanhã eu aprendo, prometi dizer.
Forte? Não pode ser fraco?
Ou melhor, com carinho.
Riram de mim quando falei.
Trouxeram-me braços,
E se foram.



Nós sempre estivemos distantes de tudo isso,
eu digo.

Quinta foi um dia mais feliz que Sexta

Até que ponto o teu medo vai ser maior que a tua vontade?
Então eu esqueci de sentir culpas, as vontades estavam à flor da pele, não pude conter os passos que levavam em direção à outra órbita. À órbita boa.
É carência, é vontade, e cada vez que vejo o brilho dos teus olhos, não preciso admirar o pôr-do-sol, nem correr pelas estrelas para sentir-me inteiro.
Voltei naquela esquina, onde as rosas foram deixadas levemente, timidamente, um poema mal escrito, na hora, no fulgor. Agora eu volto. Um tempo depois, mas o tempo não passou, ou já?
Na esquina, ninguém. Nem em casa, nem em lugar algum. Eu não iria lhe incomodar, não dessa vez. A esquina ainda tinha aquele ar mágico e trágico, lá circula mais do que nostalgia, circula amor, ou pe-da-ços dele.
Descendo a rua, os olhos cansados e repleto de cores, cores mágicas, auras.
A rua também era mágica, tudo que havia nela. Passei pelos caminhos que a gente fazia, nós três, e quando o tempo fechava, onde a gente se escondia, onde eu ia parar. Parei nos teus braços. Mas eu não ia incomodar.
Tudo o que eu falei foi dito com uma lágrima e o já não mais frio, mas inverno-na-barriga.
E não foi preciso dizer nada. Como o silêncio é preciso. Precioso.
A vontade era de te ver, o medo me deu.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Sonho

Você espera sentada no banco enquanto eu fumo esse último cigarro.
Já ouvi dizer que fumar ia me fazer morrer.
Não se preocupe comigo, eu digo.
A chuva vai me levar para um lugar melhor.
Por que a chuva?
Você sempre precisou de explicações para entender.
Eu só queria um momento a sós e poder dizer tudo o que eu ainda sinto.
Parece que a fumaça do cigarro tem embaçado minha visão.
Você só estava sentada na praça.
Não ganhei super poderes ao nascer, nem mesmo o dom de me expressar. Ganhei apenas um par de olhos dramáticos. Olhos poéticos.
Você estava apenas sentada, lendo a revista semanal.
Eu não sei quem estava no poder. Nunca soube.
Só tinha alguns contos na pasta, estava de passagem, não esperava por isso.
Eu esperava por silêncio.
Quando você não precisa falar besteiras para sentir-se bem. Quando o silêncio não lhe é incomodo.
- Mamãe, mamãe! Olha o que achei!
Esse momento parou. Parou por muito tempo na minha cabeça. Mamãe. Mamãe!?
Pára tudo! Eu quero voltar!
- O que, minha filha?
- Olha, não são lindos?
- Sophia! Jogue isso fora!
Às vezes o que nós achávamos impossível, acontecia.
O impossível nunca foi medido, eu não sabia o que fazer.
Oi, tudo bem? Se lembra de mim? Olha só, quem é? Sua filha? Meu Deus, que coisa linda, como se chama? Ah, Sophia...
Ah... Sophia.
Mas não havia o que falar.
Você só estava sentada, lendo e cuidado de sua filha.
Eu não cuidei de você.
Saí. Corri. Voei.
Existem momentos na vida que a gente não sabe para onde ir.
Cidade natal, meu primeiro emprego, ver o pessoal da imprensa.
Zero Hora.
- Mas olha só! Quem é vivo sempre aparece!
Não queria falar.
- Se tornou famoso nas gringa e depois sumiu né? Quem diria...
Não queria elogios.
Não sei o que fui fazer ali.
Talvez a pancada tenha sido fraca, mas na próxima fui a nocaute.
- Oi... Senhor Iotti, deseja alguma coisa?
- Não, obrigado.
- Rafa, posso te chamar assim?
- Como sabe o meu nome?
Não teria o porquê, só se fosse alguma empregada culta que gostasse de ler literatura inglesa.
- Não sei se tu lembras, mas...
Aquele queixo redondo, com uma leve incisão no meio, aqueles olhos cintilantes e agitados, a pele que deixara de ser adolescente para ser adulta, as imperfeições que completavam todos os ciclos da perfeição, não podia ser...
- A gente foi muito amigo na adolescência...
Era ela.
Caí no chão, fui a nocaute com apenas duas pancadas.
- Rafa...
Não precisava ser dito mais nada, eu entendi o que se passava, ela sabia que eu tinha entendido, mas o silêncio nunca foi o nosso forte. Nunca fui forte o suficiente para ouvir o estrondo mudo. Nem ao menos ajudei a sair do pesadelo. Mas eu acho que...
- Sim...
- Mas como? Quando? Por quê?
- É uma história muito comprida, Rafa. Agora eu tenho que trabalhar, senão sou demitida. Toma, meu endereço.
Eu nem sabia onde era, isso que eu sabia praticamente tudo de Porto Alegre.
Ela se foi.
Eu me fui.
Redenção, Parcão, Marinha, IAPI, nada igual. O que eu fiz?
Um breve hiato entre Rafael e meu eu-lírico.
Pôr-do-sol.
Não tinha como não chorar.
Esperei.
Meu carro era de aluguel. Meu momento também. Pedi ajuda. Achei.
- Que porra é essa?
Aquele apartamento não era apartamento, era um lixo em forma de condomínio, portas abertas, janelas arrombadas, gente chorando, onde eu fui parar?
A escada rangia mais alto que os choros, saía um pó em demasia, e o número era 607. Ela estava lá. As luzes estavam acesas. Mas eu não entrei.
Não queria me quebrar mais. Ouvi voz de homem. Não queria atrapalhar.
"Mas você não atrapalha" minha mente engatilhou o passado.
- Eu vou mandar ajuda. Eu prometo.
Era fim de tarde, nublou. Chorar era inevitável.
Chuva.
Precisava ver pela última vez quem eu abandonei, quem eu amei, amo, não sei que porra aconteceu, mas eu só queria um tempo. Um tempo a sós. Contigo. Não sei.
Poderia morrer de câncer. Mas um tempo olhando para os teus olhos, eu entenderia tudo. Todo o passado, todos os meus crimes, Rafa, Sophia, marido, revista, chuva, sol poente.
Ninguém.
O carro estava parado. Como eu.
A chuva aumentava. Eu estava procurando onde a vi.
Mamãe, mamãe, olha o que eu achei.
O que você achou Sophia, conta pra mim.
E debaixo do banco, onde você estava sentada, havia uma pulseira.
Não uma pulseira qualquer.
A roxa.
Sophia achou.
Como eu achei o que perdi.
Mas como você, deixei para trás.
A chuva caia, ninguém podia notar minhas lágrimas.
Ninguém pôde notar meus suspiros.
A chuva caía, e como caía.
Ninguém pôde ouvir os gritos de socorro.
E assim a chuva foi aumentando...
Me levando para algum lugar melhor.